Imagem: Mercedes Lorenzo |
anotações
sobre a cidade alheia
os telhados falam do que não conhecemos, eles falam a língua dos
musgos, da tinta seca, das telhas velhas: pegadas-perdidas-de-elefante. as
paredes se escoram na flacidez do tempo, preguiçosas e pacientes, acordadas
pelo som coletivo das matracas e o movimento das ancas dos cazumbás. a
obesidade da cidade é um fato; suas estrias vazam – e nelas andamos. pequenas
estações em cada fiapo de cimento ou planta, sombra do que se move e não pode
ser segura, presa, pisada. a cavidade lasciva da brisa se faz caminho: sessão
de filmes-sonhos no horário das pálpebras fechadas: – não quero que os galos
me avisem que está amanhecendo.
Imagem: Mercedes Lorenzo |
alguém comeu
minhas mortes
minha boca suja de sono no teu sonho sujo desata novelos e subtrai
gengivas: gosto de deserto em prato de cerâmica, língua escorregando pela
geometria defasada. arapuca armada: impossível resistir ao ato de se abismar. a
janela cega revela nódoas, sequelas atrás dos tijolos. o silêncio costurado com
barbante faz lembrar que as raízes cortadas fazem falta: – onde furtaram meu
quase nada há um incêndio infinito e asas longe do tronco.
*
Poemas de Demetrios Galvão do
livro Insólito, disponibilizado na íntegra em: http://www.corsario.art.br//index.php/corsario/editora
2 comentários:
As imagens dos poemas de Demetrios Galvão são incríveis e perturbadoras... Extraordinárias.
Belíssimas, também, as imagens das sensíveis lentes de Mercedes Lorenzo.
Harmonia bacana, Lara!
Li o livro do Demetrios esses dias. Foi uma grata surpresa! Linda poesia, imagens que realmente mexem com nossos sentidos. E a Mercedes, que já conheço há tempos, sempre com esse trabalho lindo de fotopoesia.
=)
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