Thousand yard stare
Gedenkt unserer
Mit Nachsicht.
Bertold Brecht
O ouro que reveste
o berço
escapa ao olho do
televisor,
sem ter visto
as ruínas de toda
Europa em trincheiras gangrenosas,
de algum modo
vencendo a neve
pisoteada por
coturnos
(que a visão
panorâmica da história
redime).
Dor que passa e
nada ensina,
além
de qualquer
morteiro ou redenção,
e o gozo de
escolher
de que lado do
arame farpado ser
fuzilado.
Canção do eremita
Quatro dias sem
sair de casa
e o que perdi?
Carros, crânios
moídos nas
madrugadas,
balões esvoaçantes
e meia dúzia de
buquês
jogados no lixo
cão que foge,
brinquedo que a rua
destrói
como um relógio,
sem
que as horas
cessem
suas
transformações.
O cortejo
da vida como quem
sai pra jantar
com uma pessoa
estonteante
e burra.
Capa: Leonardo Mathias |
Paz de espírito
Ser sábio ou tolo
demais
para correr
descalço sobre a
relva reluzente
de cacos de vidro
ao sol.
Transeuntes
abatidos
por meteoros de
ar-condicionado
e peças de titânio
em chamas,
um passo na rua,
outro
no eterno,
a alma em
regozijo,
diluída em
morfina.
Esperando estar
enganado
Cadáver adiado que
procria
F. Pessoa
De cócoras à cova
e um parto difícil,
abaixo
ao fosso, o fórceps
na mão do coveiro,
e o tempo
para envelhecermos
embotados pelo
hábito.
*
Adriano Scandolara (Curitiba,
1988) é poeta e tradutor. Os poemas acima são do seu livro Lira de Lixo, Editora
Patuá, 2013. O autor contribui para o blog Escamandro - poesia, tradução e crítica.
5 comentários:
Identificação imediata com os poemas de Adriano Scandolara. Uma lira, de fato, incomum, cortante, e sem remediações. Uma poesia que sai do óbvio, mas mantendo sua matéria sensível, e um remoer no vazio, para mim, essencial na leitura de poesia. Indico demais o livro Lira de Lixo, que está em hiperlink no post acima.
Muito bom, Lara!
Bela sequência de poesias.
É isso, Lara. O cara é fera, mas não morde, e de sobra faz uma poesia que fere...
Abr.,
Dorida, aguda, inquietante poesia...
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